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Câmara aprova projeto que facilita autorização de agrotóxicos

Ruralistas dizem que projeto ‘moderniza’ e dá ‘mais transparência’ ao tema; oposição fala em ‘PL do Veneno’. Texto volta à análise do Senado porque foi alterado pelos deputados

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (9) um projeto de lei que flexibiliza o controle e a aprovação de agrotóxicos no país. Foram 301 votos a favor e 150 contrários, além de duas abstenções.

O texto já tinha sido aprovado pelo Senado, mas voltará à análise dos senadores porque foi alterado pela Câmara.

A votação do projeto não estava prevista para esta quarta-feira. A programação do plenário previa apenas a votação da urgência ao texto – que foi aprovada por ampla maioria, por 327 votos a 71. O mérito da matéria foi colocado para debate em seguida, o que surpreendeu integrantes da bancada ambientalista.

“Senhores deputados e nobres colegas, estava na pauta a urgência e não o mérito. Para nós antes de mais nada, é preciso dizer que é uma surpresa muito ruim”, disse o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, Rodrigo Agostinho (PSB-SP).

Apresentado em 2002, o projeto é alvo de críticas de ambientalistas, que apelidam o texto de “PL do Veneno” – a discussão se arrasta há quase 20 anos no Congresso.

A bancada ruralista defende que as mudanças irão “modernizar” e dar “mais transparência” na aprovação das substâncias.

Atualmente, o processo de registro dos agrotóxicos é feito por três órgãos: a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Ministério da Agricultura.

Parlamentares da bancada ruralista afirmam que a manutenção da análise dos registros por três organismos faz com que pedidos permaneçam inalterados por até 8 anos.

Pela proposta de 2018, a decisão sobre permitir novos agrotóxicos seria exclusiva do Ministério da Agricultura – o que, na visão de críticos da proposta, enfraquece a análise dos registros do ponto de vista da saúde e do meio ambiente.

Se o texto virar lei, restará à Anvisa e ao Ibama as análises sobre os eventuais riscos dos produtos. Os pareceres serão entregues, mas a decisão final caberá ao ministério.

O projeto abre brecha, inclusive, para um registro temporário concedido exclusivamente pelo Ministério da Agricultura. O registro temporário permanecerá ativo até que o pedido seja analisado conclusivamente.

O texto também muda o nome dos “agrotóxicos”, passando a denominá-los “pesticidas”. Segundo o relator da matéria, deputado Luiz Nishimori (PL-PR), a mudança uniformiza a nomenclatura adotada pelo Brasil e pelos países-membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Discussão

Ao defender o parecer, o relator Luiz Nishimori afirmou que, com a atual legislação, a autorização de um novo princípio ativo demora de três a oito anos – o que, segundo ele, “impede que produtos mais modelos cheguem ao mercado”.

“A aprovação do projeto irá possibilitar maior produtividade, comida com preço acessível e principalmente vai trazer mais segurança alimentar para nosso país”, argumentou o relator.
A proposta foi fortemente criticada por parlamentares da oposição. O líder da Oposição na Casa, Alessandro Molon (PSB-RJ), disse que “esse projeto vai permitir que se coloque mais veneno no prato dos brasileiros”.

Tanto isso é verdade que querem esconder o nome dos produtos que esse projeto quer liberar: agrotóxicos. Querem esconder esse nome e querem facilitar o registro de substâncias que causam câncer, mutação genética, danos no aparelho reprodutor, distúrbios hormonais. São enormes os riscos trazidos por esse projeto à vida humana. Ele é péssimo para a vida humana”, afirmou Molon

Durante a discussão, Agostinho defendeu que o debate é necessário, mas que a redação do projeto leva a um “libera geral” dos agratóxicos.

“Sabemos da importância dos pesticidas, sabemos inclusive que parte da agricultura familiar usa pesticidas, mas precisamos trabalhar em outra direção. Precisamos trabalhar na direção do Plano Nacional de Redução de Agrotóxicos”, afirmou o coordenador da frente ambientalista.

“Temos que trabalhar numa perspectiva de que a análise seja técnica e rigorosa, porque o que está em jogo é a qualidade da nossa água, é a qualidade do nosso solo e principalmente a qualidade do alimento que chega à nossa mesa”.

O deputado Marcel Van Hattem (NOVO-RS) defendeu a aprovação da proposta e disse que é necessário atualizar a lei dos agrotóxicos, que é de 1989.

“Passa da hora de regulamentá-la, para garantir mais tecnologia e menos — vou repetir —, menos prejuízo à população. Hoje um processo de análise de um novo defensivo leva 8 anos. Vamos reduzir, em muitos casos, a aprovação para 2 anos no máximo, que é o que prevê essa legislação”, afirmou.

Mudança em plenário

Nesta quarta-feira, o relator acolheu uma emenda (sugestão de mudança pontual) que prevê que os pesticidas para uso próprio não precisam de registro em algumas situações. A regra proposta vale para produtos biológicos produzidos por pessoa física ou jurídica para uso em lavouras próprias.

A sugestão foi feita pelo deputado Neri Geller (PP-MT), integrante da bancada ruralista. A isenção do registro vale desde que:

  • a unidade própria de produção seja cadastrada no Ministério da Agricultura, com indicação de responsável técnico;
  • o produto não seja comercializado;
  • a produção de produto fitossanitário para uso próprio esteja autorizada no registro do produto comercial utilizado para multiplicação; e
  • não seja utilizado agente de controle biológico exótico ou sem ocorrência no Brasil.

Prazos

O texto aprovado pela Câmara altera o prazo para registro de um agrotóxico. Hoje, o parecer sobre o produto deve ser liberado em 120 dias – mas, na prática, críticos afirmam que o processo demora até oito anos. A versão de 2018 do parecer estabelece um prazo máximo de dois anos para novos registros.

Para os produtos novos voltados à pesquisa e experimentos, o texto fixa uma prazo de até 30 dias para que as autoridades concedam o Registro Especial Temporário (RET), já previsto hoje em lei. A legislação atual, no entanto, não prevê prazo máximo para a conclusão do processo.

O projeto cria ainda o Registro Temporário (RT), modalidade voltada para produtos técnicos, produtos novos, produtos formulados e produtos genéricos. Para este tipo de autorização, é preciso que estas substâncias estejam registradas em pelo menos três países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Alertas internacionais

Nos casos em que organizações internacionais alertarem para riscos ou desaconselharem o uso do pesticida, o atual relatório estabelece um rito de revisão dos registros concedidos pelo Brasil.

A análise será feita “considerando aspectos econômicos-fitossanitários e a possibilidade de uso de produtos substitutos”.

Cancerígenos

Durante a discussão da matéria em 2018 – e, agora, com a possibilidade de o texto ser levado à discussão – entidades de proteção do meio ambiente argumentam que há risco de interpretações falhas em um dos trechos previstos na proposta.

Atualmente, a legislação proíbe o registro de agrotóxicos que tenham características teratogênicas, carcinogênicas ou mutagênicas.

O projeto possibilita a reavaliação dos produtos com substâncias vetadas anteriormente e a possível autorização de uso a partir de uma escala de risco. O texto diz ainda ser proibido o registro de produtos com comprovado “risco inaceitável” ao ser humano e ao meio ambiente, mas não descreve que riscos são esses.

Em 2018, o Instituto Nacional de Câncer (Inca), órgão ligado ao Ministério da Saúde, destacou que a mudança ameaçaria a “saúde dos brasileiros” e que poderia aumentar riscos do desenvolvimento de cânceres.

Fiscalização

A proposta atribui à União a competência para criar normas e leis sobre as atividades que envolvem os pesticidas, como a produção e o comércio. O controle e a fiscalização também serão atribuições da União.

Na legislação vigente, o governo federal pode atuar criando regras e fiscalizando, mas estados e municípios têm poderes para criar regras próprias.

No projeto, estados e municípios poderão apenas criar normas quando houver omissão da União, desde que a medida seja “cientificamente fundamentada”. Entidades e parlamentares contrários ao texto avaliam que a alteração desidrata as políticas de proteção ambiental.

A Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal (MPF) avaliou, em nota divulgada à época da aprovação do parecer, que a mudança é inconstitucional.

 

Fonte: TV Globo e G1 – Elisa Clavery, Luiz Felipe Barbiéri e Marcela Mattos

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