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Transplante de células-tronco para tratar leucemia cura paciente com HIV
Paciente é submetido a transplante de células-tronco para tratar leucemia e fica livre também do vírus da Aids. Segundo médicos, trata-se da pessoa mais velha a se beneficiar do procedimento
Mais uma pessoa está sem o vírus da Aids depois de se submeter a um transplante de células-tronco para tratamento de leucemia. O homem de 66 anos é o quarto paciente do mundo a se beneficiar do procedimento, e o mais velho deles. O caso foi anunciado por cientistas do Hospital City of Hope, dos Estados Unidos, na conferência Aids 2022, em Montreal, no Canadá. No evento, pesquisadores espanhóis também relataram que uma mulher está em remissão viral, com baixos níveis de HIV na corrente sanguínea, em decorrência de um tratamento medicamentoso experimental.
O paciente do City of Hope foi diagnosticado em 1988, está em remissão viral há mais de 17 meses e não faz mais uso da terapia antirretroviral. Há três anos, o homem passou por um transplante de células-tronco para tratar uma leucemia mieloide aguda. Segundo Jana K. Dickter, professora da Divisão de Doenças Infecciosas da instituição, que apresentou o resultado em uma coletiva de imprensa, trata-se da pessoa mais velha com HIV e câncer a se submeter ao procedimento e alcançar remissão nas duas condições.
O doador da medula óssea do paciente de 66 anos tem uma mutação genética rara, a CCR5 delta 32, que torna as pessoas resistentes à maioria das cepas do HIV. O CCR5 é um receptor presente nas células de defesa do organismo, e o vírus o utiliza para entrar e atacar o sistema imunológico. A rara variante, porém, bloqueia o caminho, impedindo a replicação do patógeno.
Segundo o hematologista do City of Hope Ahmed Aribi, o paciente recebeu três terapias diferentes para entrar em remissão antes de receber o transplante. “Ele tinha um alto risco de recaída de leucemia mieloide aguda, tornando sua remissão ainda mais notável”, disse Aribi, em nota. De acordo com ele, desde a recuperação do procedimento, o homem não mostrou nenhuma evidência de ter o vírus HIV replicante no organismo, seja em amostras de sangue ou de tecidos. Ele parou de tomar os medicamentos antirretrovirais em 2021 e, desde então, tem sido monitorado de perto.
Para Jana K. Dickte, a experiência abre novas possibilidades terapêuticas. “Como esse paciente viveu mais tempo com HIV antes de seu transplante e recebeu a terapia menos imunossupressora (do que os três que o antecederam), agora temos evidências de que, se o doador de células-tronco certo for encontrado para pacientes que vivem com HIV que desenvolvem câncer no sangue, podemos usar opções de regime de quimioterapia mais recentes e menos intensivas para tentar alcançar uma remissão dupla”, disse. “Isso pode abrir novas oportunidades para pacientes mais velhos que vivem com HIV e câncer no sangue.”
Apesar de promissor, o tratamento não é indicado para pessoas que não têm cânceres no sangue. Mas, teoricamente, seria possível utilizar as ferramentas de edição genética para induzir mutações semelhantes à que beneficiou os quatro pacientes até agora considerados curados do HIV. “É teoricamente possível injetar, no braço, uma enzima que entrará nas células e eliminará o CCR5 e o vírus. Mas isso é ficção científica por enquanto”, disse, à agência France-Presse de notícias (AFP), Sharon Lewin, presidente eleita da Sociedade Internacional de Aids.
Com medicamento
Na conferência de Montreal, pesquisadores do Hospital Universitário de Barcelona também apresentaram um caso de remissão após o uso de medicamentos. Porém, a paciente, uma mulher que convive com o micro-organismo há mais de 15 anos, ainda tem, no organismo, HIV capaz de fazer novas cópias viáveis dele mesmo. A carga viral, contudo, é indetectável no sangue, e ela não precisa mais tomar antirretrovirais.
Os outros casos de cura estão associados ao transplante de medula óssea ou a pacientes excepcionais que apresentam vírus defeituosos ou fatores genéticos associados a uma potente resposta imune ao HIV”, destacou Josep M. Miró, principal autor do estudo, em nota. A paciente, porém, não tem qualquer fator genético associado ao controle do HIV. “Além disso, apresentava infecção grave em fase aguda”, disse o cientista.
Em 2006, ela entrou em um ensaio clínico de inibição viral com quatro terapias, utilizadas por 11 meses. Essas drogas prepararam o corpo da paciente para que o próprio sistema imunológico lutasse com maior eficiência contra o vírus, contou Núria Climent, bióloga que apresentou o resultado no congresso.
Há 15 anos, a mulher não toma antirretrovirais e está com a carga viral suprimida, disse Climent. “A grande novidade do estudo é que caracterizamos as células que conseguem o controle do vírus”, afirmou a pesquisadora. Os cientistas descobriram que dois tipos de linfócitos que fazem parte do sistema imune inato foram estimulados, particularmente, pelo tratamento experimental. Segundo Climent, o resultado “de cura funcional abre as portas para o desenvolvimento de novas estratégias potenciais de tratamento para aumentar a atividade das células envolvidas na resposta inata do paciente ao vírus”.
Fonte: Correio Braziliense Online