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Após transplante, duas estudantes com leucemia conseguem na Justiça o direito de fazer o Enem em hospital de SP
Alunas de escolas públicas de SP, Julia Silva e Gabriella Bonfim estão internadas no Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (ITACI), do Hospital das Clínicas, e conseguiram decisão inédita para realização do exame do isolamento do quarto
Por Rodrigo Rodrigues, Marcelo Lemos, g1 SP e TV Globo
A Justiça Federal em São Paulo concedeu liminar para que duas estudantes, diagnosticadas com leucemia, possam realizar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) dentro do quarto hospitalar onde estão internadas em isolamento, na Zona Oeste da capital paulista.
Julia Silva e Gabriella Bonfim, ambas com 18 anos, estão no Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (ITACI), do Hospital das Clínicas de São Paulo, após terem sido submetidas recentemente ao transplante de medula óssea.
As pacientes estão em quartos específicos para esse tipo de transplantado do ITACI. As acomodações, segundo o instituto, têm restrição de entradas de pessoas, ventilação e equipamentos, para evitar que qualquer agente externo cause a rejeição do paciente à nova medula.
No isolamento, as duas jovens são acompanhadas apenas pelas respectivas mães.
Segundo a advogada Sara Ferreira de Oliveira, que representa as estudantes, elas foram internadas depois de realizar a inscrição no Enem. As duas haviam recorrido à Ouvidoria do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) para poderem realizar a prova no hospital, mas não tiveram resposta do órgão no período que garantisse a realização do exame.
Por isso, ingressaram com um mandado liminar de segurança, que foi acolhido pela juíza da 7ª Vara Cível Federal de São Paulo, Diana Brunstein, em apenas um dia.
A juíza argumentou que, considerando que a internação ocorreu após a inscrição, não seria razoável negar o direito das estudantes à prova.
“As impetrantes demonstram que se encontram atualmente internadas para tratamento médico, sem previsão de alta. Não se afigura razoável a negativa do impetrado, com inegável prejuízo acadêmico às impetrantes, que enfrentam quadro de saúde tão delicado. (…) Frise-se que as reclamações junto à ouvidoria do órgão sequer foram respondidas, e os pedidos de reanálise formulados em 18.10.2023 possuem previsão de resultado em data posterior à realização do exame, sendo, nesse caso, necessária a atuação do Poder Judiciário para assegurar o direito às impetrantes”, disse a juíza Diana Brunstein.
O g1 procurou o INEP, mas não recebeu retorno até a última atualização desta reportagem.
Para Sara Oliveira, do escritório Vilhena Silva Advogados, a decisão da Justiça Federal é inédita porque assegura um direito de elas fazerem o exame no isolamento do leito.
“O INEP já entrou em contato com a família e o hospital e vai mandar um funcionário aplicar a prova no quarto das duas meninas, devidamente paramentados. Durante a realização do exame, apenas a estudante e o fiscal do INEP poderão ficar no quarto. Os médicos estão autorizados a entrar em caso de alguma necessidade das pacientes”, disse.
Reavaliação antes da prova
O Hospital das Clínicas informou que a realização do Enem em hospitais não é inédita e já é prevista pelo INEP em alguns casos. Mas a novidade agora é que Julia e Gabriela receberam a autorização para fazer o exame no isolamento, segundo Letícia Mastrocola, outra advogada que cuidou do processo judicial das jovens.
O oncopediatra Vicente Odone, diretor médico do ITACI, afirma que as duas estudantes transplantadas no início de novembro podem ficar, em média, 28 dias em isolamento completo. Esse período rígido de internação isolada pode variar de acordo com a evolução do quadro clínico das jovens.
O médico informou que, duas horas antes da prova, as estudantes passarão por nova avaliação médica para saber se o quadro clínico permite naquele momento a realização do Enem pelo período mínimo de quatro horas de prova.
Caso não estejam aptas, o ITACI pode indicar o adiamento do exame para as duas estudantes.
Quem são Julia e Gabriela
As estudantes beneficiadas pela liminar são estudantes de escolas públicas de São Paulo.
Júlia de Jesus Silva é aluna da ETEC Carolina Carinhato Sampaio, no Jardim Vergueiro, região do Capão Redondo, Zona Sul de São Paulo. Ela quer cursar Medicina e especializar em investigação criminal.
A jovem cursa o 3º ano do curso técnico em Administração e descobriu um tumor na cabeça em novembro de 2022. Desde então, passou por cirurgia, quimioterapias, radioterapias e o transplante de células-tronco autólogas.
Ela fez o transplante de medula 24 de outubro e está internada no ITACI para recuperação e a última sessão de quimioterapia.
Já a Gabriella Bittencourt do Bonfim descobriu a leucemia mieloide aguda em setembro de 2021, aluna da Escola Estadual Manuela Lacerda Vergueiro, na região do Sacomã, Zona Sul da capital.
A jovem que quer cursar artes cênicas esteve internada para quimioterapias no ITACI até maio de 2022, quando teve alta. Mas a doença reapareceu e ela voltou a ser internada em agosto deste ano.
Desta vez, os médicos indicaram o transplante de medula óssea, que foi realizado na última terça-feira (1º).
“Tenho a esperança de conseguir realizar o Enem mesmo no dia 5, mesmo sendo poucos dias após o transplante, pois quero muito ser atriz. Desde os oito anos de idade quero fazer artes cênicas, pois via muitas novelas com a minha avó, e sempre queria estar nessas produções. Depois de dez anos o sonho não mudou e estou pronta para começar nessa carreira e realizá-lo”, disse ela por mensagem.
Fonte: G1