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Mais de 100 novos casos de câncer infantojuvenil foram identificados de janeiro a agosto de 2020 no Ceará
De acordo com o Inca, uma média mensal de 30 crianças e adolescentes serão diagnosticadas com a doença no Estado entre 2020 e 2022. Diagnóstico e tratamento precoce são desafios para aumentar chance de cura
Cerca de 300 crianças e adolescentes são diagnosticados com câncer no Ceará, todos os anos. Só em Fortaleza, de janeiro a agosto de 2020, mais de 100 novos casos foram registrados pelo Centro Pediátrico do Câncer (CPC), do Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS). Muitas deles são identificados de forma precoce, o que contribui para aumentar as chances de cura, mas requer preparo dos profissionais de saúde.
Do total de diagnósticos neste ano, 29 foram entre maio e junho, pico da pandemia de Covid-19 na capital cearense. A detecção precoce e a continuidade dos tratamentos durante a crise sanitária foram garantidas por diálogo do CPC com as secretarias de saúde do interior do estado, de onde partem mais da metade dos meninos e meninas atendidos.
Garantir atenção qualificada e encaminhamento ágil dos pacientes aos serviços especializados é o principal alerta do Setembro Dourado, mês de conscientização de profissionais de saúde, pais e sociedade sobre o combate ao câncer infantojuvenil. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), a chance de cura da doença entre os pequenos é de até 80%, quando é identificada cedo.
Estimativas
De acordo com uma estimativa do Inca, uma média mensal de 30 crianças e adolescentes serão diagnosticadas com câncer no Ceará entre 2020 e 2022. A taxa bruta de incidência da doença no estado é de 125,12 a cada um milhão de pessoas entre 0 e 19 anos. Em número de novos diagnósticos por ano – 360 em cada ano de 2020 a 2022 –, o Ceará é o 3º do Nordeste.
Neste ano, em Fortaleza, conforme Selma Lessa, coordenadora médica do CPC, os meses com mais diagnósticos foram janeiro (20), junho (20) e julho (17). Em agosto, até o dia 28, nove pequenos cearenses tiveram a doença identificada. Nos oito primeiros meses de 2019, o número foi maior: 124 novos casos.
A queda, porém, está dentro da margem normal, segundo Dr. Selma. “Nosso serviço social fez um canal de comunicação com as prefeituras para que as crianças do interior, por exemplo, não deixassem de vir à Capital, não atrasassem o tratamento e não deixassem de ser atendidas no diagnóstico. Tomamos esses cuidados para que o maior número de crianças fossem vistas”, declara.
Pandemia
Entre as medidas adotadas durante a pandemia, para evitar contágio pelo novo coronavírus, foi determinada a redução do número de acompanhantes dos pacientes em tratamento. Um ambulatório para observação e testagem de quadros suspeitos de Covid-19 também foi aberto, mas teve atividades encerradas há uma semana, “devido à extinção da demanda”, segundo a coordenadora médica.
“Com essas medidas, conseguimos não atrasar as quimioterapias – mas tivemos alguns pacientes que testaram positivo para Covid. Foi um momento tenso para as famílias, por conta do medo de ter uma criança com câncer diante de uma doença tão grave como a Covid. Agora, estamos tentando entrar numa normalidade, mas respeitando todas as medidas: uso de máscara, álcool em gel e conscientização das famílias”, pontua Dr. Selma Lessa.
Atualmente, em média, 400 meninos e meninas estão em tratamento quimioterápico no hospital. Outros 900 terminaram as sessões, mas continuam em acompanhamento para monitorar possíveis novas manifestações do câncer. A maior parte dos casos em crianças e adolescentes que chegam ao centro são de Leucemia Linfoide Aguda (LLA) – que acomete o pequeno Rafael, 7, por exemplo, desde 2018.
Residentes em outros municípios
Depois de peregrinar por várias unidades de saúde públicas e ser “diagnosticado” com “dor de crescimento”, febre reumática e até calazar, o caminho de Rafael cruzou com o de uma médica que despertou para a possibilidade de câncer. “Hoje conhecemos a doença e vemos que ele teve todos os sintomas: febre, manchas no corpo, inchaço na barriga. Vários médicos atenderam ele, mas só essa encaminhou pros especialistas, e descobrimos a LLA”, relembra Eliane da Silva, 35, mãe do garoto.
Desde dezembro de 2018, então, o Lar Amigos de Jesus, casa de apoio a pacientes infantojuvenis com câncer, se tornou a morada da família, residente do município de Juazeiro do Norte. “Mesmo na pandemia, continuamos vindo toda semana, num carro da prefeitura só com a gente. Mas as médicas acharam muito cansativo e arriscado pra ele, dez horas de viagem, e passaram a quimioterapia pra ele tomar em casa e vir só de 15 em 15 dias. Ainda assim, ele pegou Covid. Mas foi assintomático, ainda bem”, relata Eliane. A previsão é de que Rafael permaneça em tratamento até março de 2021.
No pico da pandemia, quando decretos de isolamento social rígido vigoravam em várias cidades cearenses, o Lar Amigos de Jesus chegou a abrigar o dobro de pessoas que o comum, segundo a presidente, Irmã Conceição Dias.
Para evitar a disseminação da Covid-19, a casa era sanitizada três vezes ao mês, máscaras foram distribuídas aos “moradores” e totens de álcool em gel instalados nas dependências. Além disso, a entrada de voluntários foi interrompida, e pacientes vindos do interior com sintomas gripais eram isolados dos demais.
“Não tinha transporte pra eles voltarem pra casa, os municípios estavam fechados, eles acabaram ficando. Não deixaram de chegar novos casos, também. Antes, ficava uma média de 42 pessoas aqui. Na pandemia, chegamos a ter 98. O tratamento de câncer não pode parar”, relata Irmã Conceição.
As doações presenciais, contudo, diminuíram por causa do isolamento social. O alívio financeiro veio por meio do dinheiro arrecadado em algumas lives de músicas. Hoje, aos poucos, as ajudas voltam a aparecer.
Diagnóstico precoce
Um dos maiores obstáculos para identificar o câncer desde cedo, segundo Dra. Selma Lessa, está justamente nos atendimentos recebidos pelos pequenos nos primeiros sintomas. “Nossos médicos, enfermeiros e psicólogos vão para o interior, periodicamente, para dar aula aos agentes de saúde e médicos de família dos municípios, orientá-los. Para diagnosticar, precisamos pensar em câncer. Se você vir uma criança com dor abdominal e já pensar que é verme, não diagnostica”, alerta.
Segundo o Inca, os principais conjuntos de sinais de alerta de câncer na faixa etária de 0 a 18 anos, atendida pelo CPC, são palidez, hematomas ou sangramento, dor óssea; caroços ou inchaços; perda de peso inexplicada ou febre, tosse, falta de ar e sudorese noturna; alterações ou manchas nos olhos; inchaço do abdômen; dores de cabeça ou nos membros mesmo sem trauma; fadiga e tontura.
O ambulatório do CPC, localizado no bairro Vila União, em Fortaleza, funciona no regime de portas abertas, para agilizar os atendimentos. “Uma suspeita de câncer não pode marcar consulta para daqui a uma semana. Se o paciente está no interior, não está bem, e liga sexta-feira com suspeita, já vem logo pra emergência. Se estiver bem, vem no mesmo dia ou segunda-feira. Quanto mais precoce o diagnóstico, mais chances de cura ter, analisa a oncohematologista.
Fonte: G1